quinta-feira, 14 de junho de 2018


O desejo como produção!


O desejo dos idealistas, assim como no mundo psicanalítico cria realidades inalcançáveis e sem movimento no olhar de Giles Deleuze.

O filósofo Schopenhauer compara o desejo a um pêndulo que leva o ser humano à dor e ao tédio. Desejar para ele é sofrer. A vontade é inconstante e insaciável, desejando sempre algo diferente. Nada há que de maneira definida preenche a falta! Não se encontra uma tranquilidade. O Desejo é carência ou tédio! É através da supressão da Vontade , segundo Schopenhauer que o homem encontrará a liberdade.

Para o filósofo Friederich Nietzsche o pensamento de Schopenhauer é uma abordagem niilista. É uma negação. O desejo é algo abundante com exuberância. O desejo não é para ser negado, mas para ser afirmado. Se o desejo é negado, nega-se a própria realidade dele e a sua existência. Desejo para Nietzsche é Vontade de Potência. 
É através da leitura de Nietzsche e Espinosa que Deleuze desenvolve uma concepção do desejo diferente à filosofia idealista de Hegel, à filosofia de Platão, se opondo à  psicanálise tanto de Freud como a de Lacan. O desejo em Deleuze é exaltado, é forte, é o dono de seu próprio nariz porque ele produz, contrariando o pensamento que enquadra o desejo como falta.

Segundo Deleuze e Guattari o desejo jamais foi a presença da falta e sim produção. O desejo dito por Onfray em a Potência de existir é visto não como carência “mas excesso que ameaça transbordar.” Em Diálogos declarou Deleuze:
Desejo: quem, a não ser os padres, gostaria de chamar isso de “falta”? Nietzsche o chamava de "Vontade de potência” 
Espinosa chamava o desejo de "conatus" força constante de afirmação. Só há o real, feito de matéria e átomos, construções moleculares em movimento, afirmou Deleuze. Sendo assim, desejo para o filósofo é produção em constante movimento.

Desejar alguém não é ser atraído por um objeto que esteja fora, no exterior com a promessa de satisfação estática; é ser empurrado por dentro, é mover-se no real. Mas como isso acontece? Não há como explicar como isso ocorre! Definir o desejo é matá-lo, uma palavra e o desejo seria catarzeado. O desejo não deseja ser interpretado. Desejo é para ser experimentado. O desejo revoluciona, logo, o desejo é um revolucionário. Afirmam Deleuze e Guattari em Anti-édipo “O desejo é movimento que faz passar estranhos fluxos que não se deixam armazenar numa ordem estabelecida” O problema de Deleuze com a psicanálise se estabelece quando ele afirma o desejo como algo revolucionário por ser o humano máquina desejante, contrariando o olhar psicanalítico sobre o desejo.


O desejo desde muitos e muito tempos tem sido mal compreendido e moralmente malvisto, por ser interpretado como uma falta incomodativa que aflige a subjetividade humana, tendo, portanto que ser negado. Mas a compreensão que tem o filósofo Giles Deleuze que a falta não é real, mas fabricada pelo poder de dominação. As ideias de Platão, assim como o entendimento cristão de céu ou paraíso, e o idealismo de Hegel, a psicanálise de Freud e Lacan são negações ao desejo como produção, como construção. Tanto o Deleuze quanto Guattari veem na metafísica algo perigoso.  Talvez uma das maiores referências, independente de Nietzsche, que influenciou a filosofia de ambos foi o esquecido Aristipo, devido a sua posição contrária, pois vê no desejo um hedonismo racional que procura o prazer e evita a dor. Não podendo ser esquecido que na filosofia deleuziana o desejo não é falta, mas  produção.


Desejo não é sinônimo de falta na filosofia contemporânea de Giles Deleuze!
  

domingo, 27 de maio de 2018

A heteronomia impede o esclarecimento!

Os textos de kant são vistos como textos difíceis, mas o texto o que é esclarecimento é destinado a todos independente do grau intelectivo. Sendo assim, não é um texto restrito aos estudantes de filosofia.  O que é esclarecimento é o texto mais fácil de ser lido escrito por Emanuel Kant. Claro, que para entendê-lo bem, basta então saber qual é o propósito da filosofia deste filósofo do século XVIII.

No seu livro A Crítica da Razão Pura ele afirma que o filósofo não é o artista da razão, mas é aquele legisla a razão. Não se trata de uma questão dogmática, ele quis dizer que um dos papeis da filosofia é refletir sobre a própria reflexão, mas que esta reflexão participe de um uso público, onde todos possam participar, criticar, dar suas opiniões, todavia, o uso público da razão tem como objetivo àqueles que participam e interagem com a abordagem filosófica, com a finalidade de dar um refinamento à razão, um aprimoramento ao conhecimento filosófico. Vejamos o que pode ser entendido por uso público da razão dito por Kant.

Uso Público da Razão

O que é para Kant esclarecimento? É a saída da menoridade para maioridade. É quando a humanidade começa a entrar na maioridade. Na menoridade o indivíduo se encontra sob a heteronomia (hetero=outro e nomos = lei) seria  dizer estar sob a lei, sobre o comando do outro ou de outros. Já o da maioridade se encontra numa situação oposta ao da heteronomia. O maior se encontra na situação autonomia. É aquele que se  nomeia. É aquele que diz para si mesmo o que certo ou errado. Segundo Kant a humanidade vive numa situação de heteronomia.  As pessoas não decidem o que é certo e o que é errado. Quem decide por elas são as lideranças a que elas se submetem. A maioridade em Kant é quando se começa fazer uso publico da razão. Quando o ser humano começa decidir o que é certo e o que é errado, o que fazer e o que não fazer, quando se começa a pensar por si mesmo. Vale aqui ressaltar que não se trata de uma questão individualista, já que se trata do uso público da razão. É usar o entendimento e expor, discutir, debater. É uma razão republicana (res = coisa - publicana = publicanus), trata-se da coisa pública, sem negar os ensinos religiosos, não trata de negar o Estado, trata-se de aceitar essas coisas se estiverem de conformidade com aquilo que  se pensa. A razão tem que ser fiel a ela mesma. Só se deve ser aceito ou não após passar por um processo de crítica. Para Kant tudo tem que passar pelo tribunal da razão. É como se a razão fosse um juiz que após o julgamento tem a causa a aprovada ou não. A partir daí a razão obedece. Isso significa ser maior de idade. Isso é o esclarecimento que foi alcançado.

Razão monárquica

Para Kant a coisa mais contrária à dignidade humana é a razão monárquica. É aquela que impõe o indivíduo a obedecer sem questionar. Tudo tem que se engolido sem analisar. Quem está por trás dessa razão monárquica são lideres religiosos, políticos que se dizem saber de tudo, serem pessoas esclarecidas. Se por acaso, alguém, venha se opor,  duvidar desses possuidores da razão monárquica, estes dirão que há  forças contrárias, que há algum movimento a fim de contradizer as afirmações da razão monárquica. A finalidade da razão monárquica é manter o indivíduo sob a heteronomia, tirando do individuo a sua dignidade. Kant afirmou que as maiores tiranias usadas por esses “monárquicos” se encontram na esfera religiosa, impedindo o ser humano a capacidade de pensar por si próprio.  Vejamos a crítica que Kant faz no que ele disse:

“É tão cômodo ser menor (...) não tenho necessidade pensar, quando simplesmente posso pagar.”

Kant afirmou que a covardia faz as pessoas serem imbecilizadas por não se oporem aos seus tutores espirituais, por também não terem coragem de contrapor as suas autoridades.  Outra coisa associada a covardia, diz ele é a preguiça.  É no comodismo de se pagar alguém para pensar que a sociedade vive a imbecilidade coletiva gerada pelo princípio heterônomo.
Kant faz uso da frase do filósofo romano, chamado Horácio: Sapere Aude” ou seja, tenha coragem de pensar por si mesmo, com a finidade de evidenciar o lema do esclarecimento, do iluminismo. Ouse saber!
Não existe pessoas reveladas, todos somos iguais em direitos e em dignidades. Ninguém pode impor nada a ninguém sem que passe pela crítica. Vejamos mais um trecho de Kant:

“Depois de terem primeiramente (seus tutores) embrutecido seu gado doméstico
E terem preservado cuidadosamente estas tranquilas criaturas
a fim de não ousarem dar um passo fora do carrinho
para aprender a andar...”

Acontece com todos os seres humanos ao aprender a andar, tiveram algumas quedas, mas depois os seus passos adquiriram autonomia e passaram a andar sozinhas. Ninguém deve se tornar um gado que é conduzido por suas lideranças que impõe o que elas querem. Uma coisa é discutir, fazer a crítica e tudo isso no campo da razão e a outra coisa é se livrar das imposições por quem quer que seja.

“O oficial diz: não raciocineis, mas exercitai-vos!
 O financista exclama: Não raciocineis, mas pagai!
 O sacerdote diz: Não racioneis, mas crede!
 Eis aqui por toda a parte a limitação da liberdade.”

Por todos os lugares há quem queira manipular a razão, manipular o entendimento humano para que não se pense. A manutenção da heteronomia favorece a muitos, principalmente os líderes  da política, quanto os da mística, ao compararem alguns imbecis coletivos como um gado obediente a ser conduzido.

terça-feira, 22 de maio de 2018


O mistério entre o em mim e o perante mim


Gabriel-Honoré Marcel (1889-1973) , filósofo e dramaturgo francês de renome internacional, nasceu em 7 de dezembro de 1889 e faleceu e8 de outubro de 1973, em Paris.

Ao abordarmos a filosofia existencialista de Gabriel, ao que se refere à encarnação do homem e o seu mistério, o que vale aqui ressaltar, não se tratar da encarnação do Logos que se fez carne, ou seja o Cristo, mas uma  encarnação que  tem um olhar diferente ao do pensamento cristão. Quem vai discorrer sobre esse assunto como muita propriedade será o filósofo contemporâneo Gabriel Marcel.
Gabriel se converte ao catolicismo quando tinha 40 anos de idade. Foi por um longo tempo agnóstico. Gabriel Marcel foi contemporâneo de vários pensadores do seu momento, como Jean P. Sartre, Martin Heidegger, Merleau Ponty, Bergson , Paul Ricouer. Gabriel Marcel foi professor de Merleau Ponty e Paul Ricouer. O filósofo Sartre frequentava a sua casa e os dois discutiam filosofia, apresentando em alguns momentos posições diferentes.

Mistério

Gabriel Marcel foi o primeiro a afirmar que a filosofia não lida com problemas, mas com mistérios. O que seria problema na compreensão de Gabriel Marcel? Problema é tudo aquilo que se torna coisa (res), objeto. Problema é visto como um obstáculo à vida que precisa de uma solução. Gabriel Marcel afirma que problema é específico ao campo da ciência objetiva, empírica, mas que a filosofia não lida com problemas, mas com mistérios.  Mas o que seria esses mistérios? O mistério não se refere a situações abscônditas, escondidas, pelo contrário, mistério é aquilo que se dá a conhecer, sem se tornar objeto, sem se tornar posse.  No mistério quando perguntamos quem somos nós, nessa pergunta estamos presente a ela. Mistério é tudo aquilo que nos envolve sem se tornar coisa. 
A filosofia segundo Marcel restitui para nós o peso ontológico do mistério da existência. E essa existência é sentida é vivida é uma relação de mistério, não a partir de uma ideia pré-estabelecida, mas da própria encarnação, encarnação esta que acontece na própria vida, não sendo esta encarnação como mencionado antes, nada que se relacione com o cristianismo, mas encarnação enquanto corpo humano.

O corpo, um imã

O que faz esse corpo? O corpo se relaciona com o mundo, com os outros, com as coisas ao redor. O corpo é uma espécie de imã no espaço e no tempo, o corpo é como uma imantação.  Gabriel na sua filosófica ele vai dizer que ele não tem um corpo, não se trata de posse, mas que ele é um corpo e isso é encarnação.  A encarnação possibilita as relações, a comunhão.  Nesse sentido a encarnação como mistério em Gabriel Marcel tem um valor ontológico de participação junto ao outro.
Gabriel Marcel foi, provavelmente, um dos primeiros filósofos existencialista cristão.  Enquanto Jean Paul Sartre, ateu,  afirma que a existência precede a essência, Marcel contrapõe esse argumento afirmando que a essência ocorre na relação com o outro e esse outro, segundo ele pode ser o Cristo. Ele vai dizer que existe um jeito de eu me fazer humano de me construir humano através da mímese de Cristo.
Gabriel Marcel foi aluno de filosofia na Soborne, França, estudou o idealismo kantiano, ou seja, uma filosofia fora de um contexto concreto, uma coisa pronta e definida.  Ele aprendeu muito sobre a filosofia kantiana, mas ao mesmo tempo Gabriel vai ter algumas aulas no colégio de Francis com o filósofo Bergson e com este filósofo ele percebe que pode haver uma filosofia do concreto, do cotidiano.

No período da primeira guerra mundial e aos 20 anos de idade, Marcel recém-formado vai servir na guerra como aquele que tem a função de dar notícias ruins. Foi a ele atribuído avisar aos familiares os seus entes mortos na batalha. Nesse momento terrível da relação com a vida e a morte ter que responder aos pais sobre os filhos mortos na guerra que o  levou a refletir que tudo aquilo que ele aprendeu quando estudou o idealismo, sobre o mundo das essências, do mundo ideal, distante,  não contribuiu em nada para aqueles momentos de dor, a fim de dar uma resposta sobre os dramas da existência.  Através dessa reflexão ele percebeu que precisava de uma filosofia que vai ao encontro do ser humano. Uma filosofia concreta que veja o outro como o outro. Uma filosofia, onde pode ser sentida a mordedura do real. É a partir daí que ele começa a pensar na filosofia do concreto. Ele passa a se interessar pela filosofia e percebe a existência como mistério, uma encarnação, sendo ele um corpo, num processo de comunhão com toda a existência. 


O outro

Sartre nos diria que o outro é aquele que nos limita, por ser aquele que está constantemente a nos olhar.  O outro é tudo aquilo que me define. Por isso a sua frase célebre ao dizer que “o infernos, ou seja, o outro é tudo aquilo que não sou.  Marcel já diz diferente de Sartre. O outro não é aquele me limita, mas é alguém que me expande. Só na comunhão com o outro que me percebo quem de fato eu sou. O outro é uma caixa de ressonância para mim, de espelho.  O outro não é um inferno. O outro é a possibilidade de comunhão, o outro é uma complementaridade à existência.  O outro está em mim e perante mim.  






A percepção um estágio pré-refletido

O ponto de vista da filosofia ocidental a partir de Sócrates , assim como na filosofia moderna, entendia-se que a percepção era algo precário ao conhecimento ou algo que vinha a atrapalhar o processo cognitivo, por ser afirmar que a percepção engana a nossa visão, a nossa audição, ao percebermos as coisas principalmente aquelas que se encontram distante de nós e ao ouvirmos. Só que essa forma de pensar passou por uma correção, porque não é o intelecto, não é razão que nos faz termos a percepção das coisas no mundo. 

No século XX essa maneira de entender o mundo e as coisas que nos cerca foi analisada de outra forma, contrariando essa maneira de pensar, pelo Filósofo francês, Maurice Merleau-Ponty (1908 – 1961). Ponty possui duas principais abordagens filosóficas: A fenomenologia e o existencialismo. Para ele a fenomenologia é a ciência que observa o mundo antes do conceito e da ideia. E o existencialismo é saber que o homem está no mundo, não sendo o homem a continuação do próprio mundo e sim pertencente a ele.  Este acusou aquilo que durante toda a história da filosofia que tudo estaria voltado para o intelecto, mas sem que isso fosse devidamente justificado. A pergunta que Ponty faz é a seguinte: Se estamos no mundo, sem nenhuma ideia preconcebida, o que nos toca mais é a percepção que temos das coisas, a maneira como elas chegam até nós, via os sentidos ou é o nosso pensamento já elaborado a respeito das coisas? Ele chega a conclusão que a percepção é o nosso primeiro contato com as coisas a exemplo da psicologia infantil, como na vida adulta, a questão de ordem cultural, o ponto de vista das nossas relações com as coisas e também com os outros.  Percebemos então que há certa relação sensível, com o mundo, com as coisas que passa pela sensibilidade antes de se transformar num pensamento elaborado.

A partir daí se conclui que a percepção é o nosso contato imediato com o mundo, com as coisas. Mas por uma série de razões que se estendem pelos longos anos da filosofia ocidental, ouve uma fuga desse contato primário que tem sido refeito pelo ponto de vista intelectual, em razão da nossa cultura ocidental que nos ensinou, de maneira quase que radical que verdade é coisa do pensamento. A verdade vai ser algo que diz a respeito a nossa mente, nosso intelecto e dificilmente estaria numa relação direta e sensível com as coisas, mas numa relação dicotômica como em Platão no seu mundo sensível e o mundo ideal, como também em René Descarte como o seu cogito ergo sum  .
Todavia, parece não ser bem assim! O nosso estar no mundo antes de sofrer uma elaboração intelectual ele é primariamente alguma coisas que nós sentimos. Sentimos o mundo, o vivenciamos diretamente através do nosso aparato psicobiológico, sendo algo muito mais imediato e direto. Se quisermos retornar a origem do nosso conhecimento, a origem do nosso modo de existir precisará retornar ao estágio da percepção, chamado por Merleau-Ponty de pré-reflexão. Ou seja, a nossa vida não é sempre toda ela refletida, como se tudo o que nós fizéssemos e tudo o que nós fôssemos e tudo o que nos acontece atingisse o nosso intelecto. Então essa vida pré-reflexiva, pré-intelectual  que é a originária.
Se a preocupação da filosofia é a volta as origens, Merleau-Ponty propõe que essa volta seja feita através da recuperação da pré-reflexão. Isto é, que a percepção seja algo que nos revele o mundo pela primeira vez, pois sendo assim, a percepção deverá gozar de certa prioridade e até mesmo de certa superioridade sobre o conhecimento elaborado. Aquilo que nos é dado mais diretamente parece nos trazer uma verdade mais efetiva, muito mais autêntica, do que aquilo que construímos através do nosso pensamento que dicotomiza a realidade.  A percepção não é uma construção, a percepção é o modo de sentir o mundo, por ser ela   originária,  primária, primordial com as coisas, com as outras pessoas e de cada um consigo mesmo.

Contra o subjetivismo filosófico e contra o objetivismo científico

Merleau-Ponty ao escrever uma fenomenologia da percepção, se ocupou, nessa obra, com situações que tem estado presente no pensamento filosófico ocidental, tais como a relação alma e corpo, consciência e mundo e homem e natureza. Merleau-Ponty como já visto acima, era contrário as formas dicotômica. Exemplos: dicotomia entre alma e corpo, a dicotomia entre consciência e mundo, ou mesmo que dizer entre o sujeito e o objeto. Essas separações dominavam o pensamento científico quanto o filosófico.
A filosofia identificava a realidade com as ideias posta pelo sujeito do conhecimento, caindo assim no subjetivismo.  A ciência identificava a realidade como os objetos construídos por ela,  caindo no objetivismo.  Contra o subjetivismo filosófico e o objetivismo científico Merleau-Ponty escreveu:
Nós não somos uma consciência cognitiva pura, nós somos uma consciência encarnada num corpo. O nosso corpo não é um objeto como descrito pela ciência, mas um corpo humano, habitado e animado pela consciência. Nós não somos pensamento puro porque somos um corpo, mas nós na somos uma coisa porque somos uma consciência. Nós somos seres temporais... A percepção, reafirmo, é uma forma de sentir o mundo. Como tal deve ser valorizada e priorizada em nossa relação como o universo, com as pessoas e também conosco para que possamos assim perceber todas as suas nuances. Portanto, somos seres espaciais, estamos em vários lugares, preenchendo os espaços. Ouvimos enquanto falamos e, por vezes, falamos enquanto ouvimos. Quando tocamos também somos tocados. Quando vemos, por vezes, também somos vistos. Nosso corpo é a nossa forma de se ser no mundo. Por isso, buscar percebê-lo dentro deste processo que é viver é o essencial ao nosso autoconhecimento e ao entendimento daquilo que nos rodeia também.”

O tempo existe porque existimos

Através da filosofia de Ponty há duas perguntas e repostas elaboradas através da sua percepção de mundo:  A nossa capacidade de percebermos o mundo iria até aonde? Sendo o mundo, tempo e se apresenta de várias formas, não estamos no mesmo lugar, pois o enxergamos de várias maneiras! Mas como saber se estamos no mesmo mundo? Quando interagimos com o mundo. O mundo somos nós, e nós somos o mundo. Nós somos tempo. Somos consciência pretérita e do que há de vir.  O tempo existe porque existimos”

Merleau Ponty apresentou duas abordagens filosóficas: A fenomenologia e o existencialismo.  Os seus estudos foram voltados para o homem, enquanto ente existente. Os seus primeiros pensamentos e obras foram inspirados pelo pai da fenomenologia Edmund Husserl. Ponty acredita em duas principais e mais importantes características que se relacionam ao existencialismo. A primeira característica que o homem é um grande projeto a ser construído e isso se torna possível a partir de sua experiência com o mundo.  A segunda característica é a inexistência da essência, portanto o homem é aquilo que se idealiza.  O homem é foco do debate sobre o conhecer. Para Merleau Ponty a filosofia permite novo aprendizado do olhar sobre o universo que o envolve. O homem está no mundo, o que quer dizer que este não é a continuação do próprio mundo e sim pertencente a ele.
Merleau Ponty criticava as ideias racionalistas, principalmente, as ideias de Descartes que negava os sentidos como forma de experiência sensível.  Ao contrário, Ponty, acreditava que a realidade é formada pela nossa consciência e todo conhecimento limita-se ao mundo dos fenômenos. Segundo o filósofo somos uma consciência que capta através do corpo as coisas em torno, por isso não há como separar consciência e homem como fez Descartes.

Para Maurice Ponty o conceito de corpo é primordial, ao dizer “O meu corpo é o meu ponto de vista sobre o mundo”. A percepção irá ser a introdução do corpo no mundo. A descrição da realidade só pode ser feita conforme ela se apresenta, pois o conhecimento é construído pela percepção e esta é particular, imperfeita e incompleta.  Como já foi dito tem como foco a relação do homem com o mundo. Para ele a percepção é uma vivência. Toda percepção é uma forma de estabelecer sentido. Uma relação do sujeito com  o mundo ou natureza.

Membro fantasma

Em seu estudo sobre a fenomenologia há uma grande contribuição com a ciência cognitiva, uma vez que para ele não existia somente experiência mental, mas também experiência corporal, chegando a conclusão que mente e corpo na são entes separados. Ambos são partes de um único sistema. O seu estudo levou a explorar uma investigação sobre o membro fantasma situação essa que o sujeito amputado sente o membro perdido. Ele afirma que o corpo na é simplesmente uma máquina, pois se fosse o corpo não reconheceria essa parte ausente. Para ele o corpo nunca é apenas um corpo.  É sempre um corpo vivido.
Teria a filosofia de Maurice Merleau Ponty um percurso suficiente ao saber? Não. O filósofo se recusa instalar de modo absoluto o saber, contudo a reflexão sobre os seus pensamentos nos traz grandes contribuições. “A ilusão nos engana justamente fazendo-nos passar por uma percepção autêntica” Na compreensão Pontyana a realidade é uma ilusão, assim como a certeza de um determinado fato ocorrido. A razão de uma ação é desconhecida e avaliá-las é uma prática de ilusão.
O mundo é uma constante ilusão.

sexta-feira, 11 de maio de 2018


Jean-Paul-Sartre (1905-1980)

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EXISTENCIALISMO

Sartre escreveu um livro intitulado O ser e o Nada que foi a sua principal obra filosófica, em 1943. Sofreu forte influência da fenomenologia de Husserl e da filosofia de Heidegger.  
Numa artigo que Sartre escreveu sobre Husserl, lemos:
“O espírito-aranha atirava as coisas em sua teia, as cobria de uma baba branca e lentamente a deglutia, reduzindo-a em sua própria substância." 

Sartre faz uma crítica ao pensamento francês da sua época mostrando que o  conhecimento era adquirido, comparadamente, a uma deglutição animal, conforme a figura da aranha que atira as coisas em sua teia, cobrindo-as com uma baba branca e de maneira lenta, deglutindo-as.  A partir daí que Sartre verá em Husserl a melhor compreensão da filosofia se contrapondo a estágio primitivo, segundo ele, do conhecimento. E contra tudo isso, Sartre aponta a novidade de Husserl que é a impossibilidade de dissolver as coisas na consciência, contrariando a doutrinação espiritualista francesa dos séculos XVIII, XIX e XX em que o espírito-aranha deglute na consciência o que foi apreendido de fora para ela.  Sartre combate esse pensamento por entender que a consciência não é um receptáculo e também não é nenhum órgão que tenha como função metabolizar a realidade.

Na interpretação do Sartre sobre a fenomenologia husserliana é que consciência e mundo surgiriam simultaneamente. O mundo surge para a consciência ao mesmo tempo em que escapa dela. Vamos aqui exemplificar a fim de tornarmos menos denso. Sartre diz o seguinte: “Se eu vejo uma árvore eu a vejo onde ela está. Eu não preciso que ela entre na minha consciência para que eu a perceba, nem muito menos preciso que a minha consciência se perca nela.” Sartre com isso deseja mostrar que “não se pode sem desonestidade comparar o conhecimento com a posse.” Conhecer não é apoderar-se das coisas. Então, o que é conhecer? Qual é a atividade que a consciência desempenha no conhecimento? A consciência vai na direção das coisas, ela vai como escorregando na direção das coisas. É aqui que se explica a intencionalidade husserliana, no sentido de perceber as coisas. 

A partir dessa compreensão que o Sartre tem da concepção de consciência proposta por Husserl que ele (Sartre)  chamará de “translucidez” ou seja a consciência translúcida. Isto significa dizer que a consciência é um vazio, um simples movimento, ela é um ato.  Sartre vai dizer que a consciência é “um vento que se lança livre em direção das coisas.” Com isso ele queria deixar evidente que a consciência não tem como função aprisionar as coisas por ela não ser um compartimento intelectual.
René descartes havia definido a consciência como uma coisa pensante. Descarte via a consciência como uma essência e Husserl discordam mostrando que a consciência é apenas um movimento. Sartre entra em cena para dizer que não sendo a consciência um compartimento fechado, tudo, então, está fora. E até nós mesmos estamos fora de nós mesmos, ou seja, fora entre os outros, “na rua, na cidade, no meio da multidão, coisa entre coisas, homens entre homens”. Sartre vê a consciência como uma intencionalidade pura, como um simples movimento na direção das coisas.

No seu livro O Ser e o Nada Sartre diz que “o primeiro passo da filosofia é expulsar as coisas da consciência e restabelecer a relação entre a consciência e o mundo. A saber a consciência como consciência do mundo.” Uma consciência posicional, diz ele. Uma consciência que  posiciona os objetos e se posiciona frente a eles. Sartre desenvolve o seu pensamento numa ontologia baseada nessa oposição. A consciência como um vazio, como um movimento e as coisas na densidade que as caracteriza.

No existencialismo sartriano essa consciência, esse vazio ele chamará de para-si e o ser denso todo fechado ele chamará de em si. O termo que Sartre usa para designar a consciência, para- si, causa certo estranhamento, porque a ideia que se tem dessa preposição para não deve ser entendida como um retorno, uma volta reflexiva para si, jamais ele propôs isso.  Ele está querendo dizer exatamente o contrário. O para sartriano significa para fora, ou seja, a consciência deve lançar-se para fora. Mas não é para-si? Só que este si está fora. Aqui que se encontra o centro da concepção sartriana de sujeito, que depois reaparece na psicanálise lacaniana. O si ou si mesmo onde ele está? Não dentro de si como pensava os cartesianos, mas está fora de si, de si mesmo. Esse para-si é um movimento para atingir o sujeito. Nós somos um movimento para chegarmos a nós mesmos. Esse movimento, portanto, nunca se completa. O sujeito, portanto, não volta para si, ele vai à direção de si porque este si está fora dele.

O para si que é o para fora de nós que se opõe aquilo que está diante dele, o mundo, as coisas, essa coisa aparentemente maciça, Sartre chamou de em si. Este é o denso de realidade. Todo fechado em si mesmo, provavelmente esteja aí a razão do seu livro: O Ser e o Nada. Nada.  Em razão da nossa linguagem se encontrar permeada pela ontologia grega não temos como nos libertarmos do verbo ser ao dizermos que a consciência é nada. Quando afirmamos que a consciência é, já estamos dizendo que ela é alguma coisa. Mas não é isso. Não tem como nos livrarmos do é.

O para si não se constitui como ser, mas se constitui como a negação do ser em si. Quando falamos de sujeito não falamos de uma realidade afirmativa, mas de uma realidade negadora. A consciência se constitui ao negar aquilo que está diante dela. Se a consciência realizasse a sua trajetória na direção do seu si, onde esse para na direção de se consumasse, então o sujeito se transformaria no ser, se transformaria no em-si e deixaríamos de ser esse processo constante que é a nossa consciência. Quando afirmamos que a consciência não tem ser, queremos dizer com isso que a realidade humana não tem ser fixado numa essência. Assim entendemos que a consciência não está para si, mas se projeta, se lança na direção de si mesma, sem, no entanto, nunca se alcançar.

A consciência ou o sujeito não é coisa alguma ele é o que ele se faz. Existir não é algo da ordem do ser, mas é algo relacionado com o processo, com o vir-a-ser, com o tornar-se. A consciência é um constante transcender-se, ou seja, é um ir para fora de si tentando superar-se. O ser humano é um projeto. Mas aqui parece haver uma contradição? Um projeto é algo que ainda não é. Mas isso mesmo que Sartre quer dizer como projeto. Esse paradoxo é proposital.  Nós somos aquilo que ainda não somos. Mas quem projeta, quem está por trás desse projeto? Sartre vai dizer que é a liberdade. O constante projetar-se, o constante transcender-se não outra coisa senão a liberdade. Primeiro o homem existe, se descobre, surge no mundo e só depois será conforme se fizer, de acordo com o que tiver projetado. 

Aqui então há algo muito importante a ser observado que a liberdade não é um atributo do sujeito. A questão  não é saber se o sujeito é ou não é livre. Ao definirmos a consciência com esse movimento, como ato,  como o vento, isso é a liberdade. Não é se o sujeito tem ou não tem a liberdade. Ele é a liberdade. Somos livres para tudo, menos pares deixarmos de sermos livres. O sujeito é livre para qualquer opção, menos para não optar. É algo impossível. Por isso da famosa frase de Sartre: “O homem está condenado a ser livre”.

quarta-feira, 9 de maio de 2018


O conhecimento, um encontro bipolar!

Fenomenologia


Edmund Husserl (1859 – 1938)

O significado de fenômeno se volta para tudo aquilo que se manifesta no plano da consciência. Tudo que é oriundo de uma experiência sensorial pode ser encarado dentro do universo fenomenológico. A fenomenologia é o método epistemológico que fundou a filosofia contemporânea.
O ponto de partida da fenomenologia está voltado para uma questão muito geral e tratada durante por longos tempos pela filosofia que é a relação entre sujeito e objeto. Uma relação de conhecimento e como se constitui o conhecimento.

Vertentes

Todavia antes de vermos como Husserl apresenta a sua compreensão fenomenológica, devemos atentar, ainda que sistematicamente, como se constituiu na modernidade (1453 -1789) essa abordagem relacionada ao sujeito e ao objeto.  Há três vertentes:

A primeira vertente é a realista. O realista é aquele que sustenta o primado do objeto. O objeto é o  de maior importância. Ou seja, as representações que se faz das coisas está subordinada aos objetos em si mesmos ou as coisas em si mesmas, apreendidas pelos sentidos e depois registradas pelo intelecto.  Sendo assim,  se compreende pela vertente realista que o ponto de partida para aquisição do conhecimento se dá pelo objeto ou as coisas em si mesmas.

A segunda vertente é o idealismo. Já o idealismo se foca na primazia do sujeito, das ideias, da mente. O sujeito é o mais importante, segundo esta vertente, para se adquirir o conhecimento.  Contudo, se observa nesta vertente que um acordo tenta se estabelecer de conformidade entre as ideias e as coisas, entre o objeto e o sujeito, embora sendo tendências que se opõem entre si.

A terceira vertente se manifesta no século XVIII foi à filosofia de Kant. A sua filosofia procurou desfazer o impasse entre o realismo e o idealismo, através do questionamento sobre que tipo de contribuição que o próprio objeto, as próprias coisas dão ao conhecimento e qual é a contribuição que o próprio sujeito colabora com o processo do conhecimento.  Aqui se observa que não se privilegia nem o objeto nem o sujeito, mas que visa buscar o resultado através de numa síntese para aquisição do conhecimento.

Ao considerarmos o viés da correlação, entendemos que não existe objeto que não esteja comprometido com o sujeito que o reconhece ou o representa.  O sujeito é a consciência que apreende o fenômeno, como a realidade que por ele (sujeito) é constituída.  Agora considerando o objeto, ele nada mais é, que esse fenômeno apreendido pela consciência.  Mas o que significa apreender? O que seria o fenômeno apreendido como mecanismo de conhecimento? Se compreendermos essa apreensão como assimilação das coisas pelo sujeito que as percebe, como se essas coisas se transferisse do mundo para a nossa mente o resultado dessa posição seria o desaparecimento do objeto, das coisas, através da incorporação total pelo sujeito. Husserl vai discordar do posicionamento kantiano porque se o objeto for apreendido pelo sujeito ele perderá a sua autonomia.


É necessários voltar às coisas mesmas

A partir das considerações feitas nos parágrafos anteriores que passaremos a entender à abordagem husserliana sobre o seu propósito com a inauguração da fenomenologia ao dizer o seu grande lema “é necessários voltar às coisas mesmas.” Conhecida como redução eidética. A que se considerar a importância das próprias coisas na relação de conhecimento.  A necessidade de se voltar às coisas se dá em razão de se perceber a contaminação das coisas pelo o sujeito.  É como se o sujeito tivesse um poder grandioso sobre o objeto, como se a consciência tivesse um poder tamanho sobre as coisas que nessa assimilação as coisas se adaptariam de tal moldo a consciência que elas não permaneceriam com realidade própria.  O sujeito projeta nas coisas vários componentes quer de ordem lógica, quer de ordem psicológica, etc., toda essa projeção que fazemos no mundo para depois do mundo apreender as coisas, contamina o mundo e contamina as coisas, de tal modo que acabamos recolhendo do mundo as coisas que lá colocamos. A realidade própria das coisas acaba ficando comprometida com essa maneira de conhecer.

Purificação

Husserl vai então tentar instituir um método em que as nossas relações com as coisas se torne mais autêntica, de forma que possamos recuperar a realidade do mundo e a realidade das coisas. Mas como isso seria possível? Através da purificação da relação entre sujeito e objeto. Desfazendo da contaminação do pressuposto vinculado ao próprio sujeito, como se o conhecimento fosse uma competição entre o sujeito e as coisas. Não é nada disso. O que Husserl quer recuperar uma relação mais equilibrada entre essas duas instâncias. Husserl percebe esse equilíbrio já que uma vez purificada a consciência desses pressupostos que comprometem a nossa relação com as coisas, percebe ele então que era uma coisa que deveria ter sido sempre e não de tamanhas contaminações da consciência.

A consciência é sempre consciência de alguma coisa, essa compreensão já nos permite definir o que é consciência. Não temos como definir a consciência fora da relação consciência de alguma coisa. A consciência não seria nada se ela não se apresentasse como consciência de alguma coisa.  A consciência não é uma coisa que se opõe a outras coisas. A consciência de é sempre um modo que o sujeito percebe o mundo e percebe as coisas. A consciência não é uma realidade substancial ela é apenas um movimento de olhar, um olhar intelectual.
As coisa para não se tornarem objetos da consciência é preciso que elas permaneçam com a sua realidade própria, com autonomia própria.

A intencionalidade

A intencionalidade nome fixado por Husserl para significar o modo como a consciência vê as coisas.  A consciência tem intenção com relação às coisas. A consciência as visa, a consciência olha as coisas. Isso é que a constitui. Isso que ela tem como realidade, ou seja, ao olhar as coisas intencionalmente. Quando se diz que a consciência tem a intenção de alguma coisa, não significa que a intenção de, trás a coisa intencionada para a consciência como se apropriando dela.  Não. A coisa intencionada pela consciência permanece fora da consciência. A intenção de, não apreende a coisa. A consciência que se tem da coisa é que ela permanece fora do sujeito.  As duas coisas têm que ter a sua funcionalidade própria: Sujeito e objeto. Cada um na sua. Como a consciência é um ato de ver, ela jamais poderá interferir na autonomia do objeto.  
Já que há sujeito de um lado e objeto de outro, sendo ambos diferentes, não se pode pretender que o sujeito dotado de uma objetividade venha ser comparado as próprias coisas. A natureza do sujeito é diferente.
O fato de se dar ao mundo um caráter inteligível, de se conhecer as coisas, acontece num encontro entre a consciência e o mundo. Entre a consciência e as coisas. Nessa relação bipolarizada que o conhecimento é constituído.  Portanto nem a consciência constitui sozinho o conhecimento, nem as coisas no mundo constitui também. O conhecimento se dá no encontro bipolar.

sexta-feira, 4 de maio de 2018


O tic-tac e a indiferença ética!



A moral é um conjunto de regras válidas para todas as pessoas e essas regras determinam a conduta humana em sociedade.  É o como se deve agir para não ferir o direito do outro e respeitar o bem comum. Mas dessas regras podem surgir dilemas particulares, como por exemplo, a eutanásia. Como agir diante dos grandes desafios  morais? É a partir daí que surge a ética.  Mas o que é um procedimento ético diante da vida? Uma conduta ética é uma tomada de posição, é uma atitude, onde jamais prevalece a indiferença. 

Se um de nós ao deitarmos à noite ouvirmos o som onomatopaico do relógio, com o seu  tic – tac, durante de poucos segundos não iremos perceber que o som do tic-tac desapareceu, mesmo com o som continuando com suas repetições. Sempre que alguém é exposto a um estímulo repetido, o estímulo é banalizado, não se percebe mais. Ao passarmos repetidas vezes, perto de uma pessoa pedindo esmolas, aquela pessoa estará ali, agora, indiferente ao nosso olhar e aos nossos ouvidos como o tic-tac do relógio, isso em razão de banalizarmos a vida.  Essa é a nossa realidade na sociedade em que vivemos. Uma sociedade extremamente banalizada é aquela que entrou em exaustão pelas repetições das mesmas coisas, tornando-se indiferente. A banalização leva a insensibilidade, leva a indiferença e a indiferença desqualifica o outro e o outro passa a ser o que não é.

quinta-feira, 3 de maio de 2018


A moral do rebanho e a moral dos senhores

Nietzsche foi um filósofo alemão que viveu na metade do século XIX. Ele fez uma critica radical não só a filosofia que o antecede, mas a toda cultura do mundo ocidental. De acordo com Nietzsche a realidade é formada por dois grandes princípios: o apolíneo e o dionisíaco. Apolíneo vem do Deus grego Apolo que representa a razão, a retidão, a ordem, a harmonia e a perfeição que existe no universo. Dionisíaco que vem do Deus grego, Dionísio que representa a desordem, o caos, a intuição e a sensibilidade, realidades subjetivas.

Segundo Nietzsche os gregos viviam repeitando essa composição da realidade. Aproveitando tanto o lado racional, quanto o lado do emocional e instintivo das expressões humanas. Nietzsche ao olhar para a filosofia socrática-platônica afirma que esta filosofia fez o de pior que poderia para o mundo e pensamento ocidental. A filosofia socrática-platônica deu enorme valor a origem do pensamento apolíneo em detrimento à abordagem dionisíaca. A filosofia socrática-platônica cria uma filosofia categoricamente racional, ou seja, totalmente calcada na razão. É importante aqui revermos que na abordagem apolínea tudo é muito regrado voltado para o que é correto. Aqui, segundo Nietzsche, o  homem é enfraquecido. À abordagem apolínea faz com que o homem não aproveite tudo àquilo que a vida tem para oferecer. A razão escraviza o homem. A filosofia socrática-platônica desfaz também de toda a criatividade que existia na filosofia pré-socrática.

A partir do que acabamos de ver, Nietzsche vai elaborar a Genealogia da Moral, ou seja, uma investigação histórica da formação e da construção dos valores que criou a moral no ocidente. Qual foi a finalidade dele fazer essa investigação? A finalidade foi pautada em comparações, como por exemplo, se certo e errado são universais ou não. Se bem ou mal também apresenta as mesmas características de universais ou não. O bem é absoluto? O mal é absoluto? O certo é absoluto? O errado é absoluto? O que é justo é absoluto? O que é injusto é absoluto? Esses valores servem para todos os seres humanos de todas as épocas e de todos os lugares? Nietzsche vai dizer que não. Ele vai afirmar que isso é uma elaboração, uma construção humana que em determinado período social os homens criaram valores afirmando que eles são absolutos. Mas por que será que se crê que esses valores são absolutos em nossos dias? O cristianismo é o responsável em afirmar que essas criações humanas, a respeito dos valores, não são humanas, mas de Deus. Ora se os valores são divinos, logo, são absolutos.  Nietzsche vai discordar por perceber que esses valores são heranças socrática-platônica-aristotélica que o cristianismo lançou mão. O cristianismo passa a ser uma religião platonizada. Platão quem escreve os pensamentos de Sócrates e Aristóteles se apoia na razão socrática com um olhar voltado para apolíneo, tudo muito organizado.

Nietzsche afirma que o cristianismo não tem nada de absoluto. O cristianismo é uma das interpretações possíveis do homem no mundo e o seu futuro. O cristianismo é uma ideologia que ensina o homem ver e encarar a realidade.
No cristianismo Nietzsche percebe dois tipos de moralidade: A moral dos escravos que é a mesma moral de rebanho e a moral dos senhores. Essa moral do rebanho é a moral dos ressentidos, dos fracos que surge em contraposição a moral dos senhores. A moralidade do cristianismo é a moral do rebanho, dos escravos. Uma moralidade que enfraquece e que degenera o homem. Uma moralidade fundamentada nos princípios de bondade, humildade e piedade. Mas isso não deve ser visto como algo bom? A crítica radical de Nietzsche vê nessas atitudes algo que degenera e deixa o homem pior.  

O que é bom é a moral dos senhores que é fundamentada na alegria, na invenção para uma vida feliz e na afirmação da vida. No dizer sim à vida que é contrária a moral do rebanho que nega a vida,  que se martiriza, que se reprime. Uma moralidade dos perdedores ressentidos com os senhores. O ressentimento desse rebanho perdedor transformou a  bondade, a humildade e a piedade que são ruins em coisas boas. Essas qualidades foram colocadas aí para a humanidade, para o mundo ocidental como comportamentos certos a serem vividos.

Quando Nietzsche coloca esse pensamento contrário a moralidade do rebanho, na Europa, foi nomeado niilista e foi acusado de querer acabar com toda a forma de vida social e  acabar com a cultura do mundo ocidental.  Mas seria isso mesmo? Não. Nietzsche queria na verdade acabar com esses valores ressentidos de bondade, humildade e piedade. Nietzsche desejava fazer uma transmutação em tais valores. Fazer uma troca de valores, pois ele entendia que a bondade, a humildade e a piedade são ruins e degeneram o homem, tornam o homem fraco e fazem o homem dizer não à vida.

Então Nietzsche vai propor a criação de um novo ser que não é mais o homem. Esse ser deixou o homem para trás e esse ser agora é visto por Nietzsche como Além-Homem. Esse Além-Homem é totalmente fora da moralidade de rebanho e melhor que a moralidade dos senhores.  O estilo de vida passa ser fundamentado na vontade de poder. Poder aqui, não é poder político, nem de dominar alguém, mas poder de ser senhor de si mesmo. Este seria o novo ser proposto por Friedrich Nietzsche.

quarta-feira, 2 de maio de 2018


Michel Foucault (1926 – 1984)

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Michel Foucault foi um filósofo francês contemporâneo que refletiu profundamente sobre o poder e o conhecimento. Foi um ativista que se envolveu em campanhas contra o racismo. Vários problemas sociais foram alvos de seus estudos, dentre eles, a psicanálise, a psiquiatria, a sexualidade, a escola e o sistema prisional.

A exclusão do discurso            

Alguns aspectos a serem considerados na atividade foucaultiana é que eles vãos se concentrar em três grandes temas: o Interdito da fala, o banimento do discurso do louco e a vontade de verdade.

O interdito da fala

O que seria o interdito da fala? É a interdição de certos discursos através dos discursos normalizados. É bom atentar aqui que o termo normalizado, vem de norma, discurso regrado, limitado ao exprimi-lo. A interdição feita ao discurso tem um alcance muito grande, mesmo que o discurso interditado consiga  expressar críticas a determinadas situações ao discurso normalizado, Foucault tenta através da crítica a tal discurso, denunciar a negação que os discursos normalizados impuseram sobre os discursos interditados. 
O discurso interditado sofre um afastamento do discurso normalizado. Em todos os momentos que o discurso interditado reaparece, ressurge, o discurso normalizado se reforça cada vez mais, mostrando a sua rejeição ao discurso interditado. Seria o mesmo que dizer que a norma estabelecida é a que vigora, rejeitando o discurso que contraria a posição do discurso interditado, proibido. A grande característica do discurso normalizado é a sua posição rígida, contrária à subjetividade do discurso interditado.

O louco e o seu discurso

O banimento do discurso do louco se caracteriza, então, em razão do louco apresentar um discurso muito repetido, persistente e denunciador. Sendo assim,  a única saída que o discurso normalizado encontra é de afastar o discurso do louco e o próprio louco através do isolamento não dando a ele a liberdade de se expressar, lançando-o a um espaço cerceado e inacessível.  Por que isso? O discurso do louco se repete, o discurso do louco é incontrolável e cuja principal característica é o seu aspecto denunciante das verdades estratégicas que foram construídas pelos discursos normalizados. O discurso do louco incomoda o discurso normalizado já formatado e pétreo, porque vai de encontro às verdades estabelecidas pelo discurso que interdita. 

A Vontade de verdade

A característica central da vontade de verdade é que o discurso busca sempre uma construção estratégica de uma verdade. A estratégia serve para reforçar e legitimar o discurso, permitindo um instrumento essencial para a interdição da fala e o banimento de certos discursos. A verdade interditada passa contrariar todos aqueles discursos normalizados que sempre tenta desfazê-la. Se o discurso interditado que é oposto ao normalizado traz um discurso distinto do normalizado ele é de imediato refutado, negado, em razão do não alinhamento. É a partir daí que se entende o que vem a significar o que é vontade de verdade. A vontade de verdade constrói o seu discurso ludibriado, visando sempre legitimá-lo.

A loucura em Foucault

Foucault tenta mostrar na sua história da loucura que a loucura não é um dado biológico, mas um fato de cultura. Se cada época tem uma visão o que é um homem normal e o que é o homem louco à ação dos médicos sobre esses, que eles denominam loucos tem muito a ver a com o seu contexto cultural. O que se entende por normal em épocas diferentes?  Foucault afirma que cada época tem uma visão das coisas de maneira diferente. Nos tempos medievais muitas pessoas que nós os chamaríamos de loucas, se estivessem no atual contexto de vida, com certeza elas seriam medicalizadas, no período medieval tais indivíduos eram líderes. Líderes messiânicos e conduziam multidões. Na Rússia no século XIX essas pessoas que hoje são consideradas loucas eram vistas como aqueles quer tinham  um saber esotérico, um saber diferente, um discurso diferente.
A maneira de se entender o que é um homem louco e um homem racional ganha o seu formato no período renascentista. Todavia, mesmo ainda nesse período a loucura não é vista como algo que deva ser banida, excluída.  A gravura de Hieronymus Bosch “O Navio dos Loucos”.

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Na gravura se percebe que a loucura não é uma coisa ruim.  A loucura é uma das formas da razão.  Ver esta obra e ver outras obras do Renascimento, como o Elogio a Loucura de Erasmo de Rotterdam entenderemos que podemos aprender muito com a loucura e que todos temos algo de louco que nos habita. No Renascimento a loucura era um espelho da sociedade.
A partir do século XVII as coisas começam a mudar. É um período que pode ser nomeado de era cartesiana. O louco nesse período passa a ser visto como aquele que está errado. A razão passa ser idolatrada por ser ela que conduz o homem ao correto, ao certo, então o louco passar ser aquele que não tem direito à verdade. Aqui, então, se percebe que razão e loucura se distam. É neste século que os loucos começam a ser internados em hospitais denominados psiquiátricos. Entre esses loucos eram internados os homossexuais e alcoólatras vistos da mesma maneira, insanos.
Já no século XIX o  entendimento  que se tem sobre a loucura começa a mudar. O louco é visto como um doente. A partir daí é dado a classe médica a capacidade de definir o que é normal e o que é patológico e o dever de trazer o louco para a normalidade. Aqui podemos então retomar o que já foi dito antes sobre o discurso interditado e o discurso normalizado, de onde se conclui que o olhar sobre o louco, sobre a normalização do discurso, depende da época e do contexto cultural em que se vive.

Panóptico

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O Panóptico foi um conceito elaborado por Jeremy Bentham no século XVIII para poder explicar de uma maneira ideal um controle de um poder central sobre uma população a ela subordinada. Seria um lugar onde o controle funcionava de ver sem ser visto, sendo que todas as pessoas que estivessem no em torno dessa estrutura de poder poderiam ser vistas sem ver. Tipo de  modalidade com características de poder absoluto. Foucault baseado na ideia de Bentham vai explicar no seu livro Vigiar e Punir as várias maneiras de ter o controle sobre o outro. E um das considerações é que o ser humano se encontra preso sob o olhar dos outros. Diríamos que as câmeras BBB estão instaladas na realidade social. O homem é um ser sob constante vigilância. E esse poder que é exercido sobre o outro, começa dentro da própria família, ao que Michel Foucault chamará de microfísica do poder. O ser humano sob constante observação é um indivíduo punido, isso em razão de ter os seus passos continuamente vigiados. Tudo é contabilizado e anotado sobre ele, tendo ele cometido alguma falta ou não. O homem é prisioneiro do olhar alheio.  

Escola e prisão

Será que para o prisioneiro ser acostumar na prisão ele teria que passar por uma escola que tivesse um formato igual? Embora a escola seja um lugar de educação, onde os alunos interessados em aprender, adquirirem conhecimentos, Foucault, se manifesta afirmando que o sistema educacional, aprisiona o aluno. Ele não disse que a base da prisão é a escola. Em nenhum momento afirmou isso. Mas que o sistema educacional num todo, apresenta características aprisionadora. Por exemplo: os alunos nas escolas são obrigados a usar uniformes, no presídio também. Os portões das escolas têm cadeados, assim como nos presídios também. Nas escolas também têm grades separando os alunos de alguns lugares restritos, assim também nos presídios.  Nas escolas têm horários separando disciplinas sempre com um tocar de sirenes, nas prisões também têm campainhas para determinados momentos diferentes dos outros. Assim como tem inspetores vigiando os corredores das escolas, há também nas prisões. Na escola tem Diretor, nos presídios também. Embora na escola não tenha solitária, muitas das vezes o aluno tem que ficar solitário em algum local da escola como medida disciplinar ou solitário com o Diretor prestando  satisfação do seu feito indisciplinar. Há alunos que pulam os muros da escola para não assistir as aulas, na  prisão também acontece isso, as chamadas fugas de prisioneiros. Parece que o modelo prisional se assemelha à ideia de escola, todavia a diferença entre a escola e a penitenciária se caracteriza que os presos cometeram delitos, crimes, e na escola a educação deverá sempre contribuir com o desaprisionamento interno de cada aluno na transmissão não só conteudista, mas de valores a serem refletidos à vida como aspectos categoricamente libertadores. Nada neste mundo deverá ser feito sem pensar num resultado que beneficie o outro. A educação na produção do conhecimento é o caminho para fazer homens livres. 

sexta-feira, 27 de abril de 2018


Resultado de imagem para schopenhauer                                                                                                   Arthur Schopenhauer
"A vontade é um cego
 robusto que carrega 
um aleijado que enxerga"  


O mundo é minha representação,” disse Schopenhauer.  O que ele queria dizer com isso? Muito provável que ele recorreu a uma distinção do filósofo Kant sobre a coisa em si, o noúmeno e a coisa para si, o fenômeno. Tanto Kant quanto Schopenhauer vão dizer que nenhum ser humano conhece a realidade em si. Não se conhece a realidade como ela é.  Todas as coisa que o ser humano conhece está dentro da sua capacidade limitada de conhecer. Nenhum ser humano conhece a estrela central do sistema solar, o Sol em si. Ele é inatingível e inalcançável. Tudo que se conhece são os olhos que veem o Sol. Ou seja, o que é possível se conhecer do Sol. Tudo o que se conhece é em razão das percepções, das ideias, do que a mente humana é capaz de conhecer. Na verdade isso já está na física. Quando o sujeito interage com o objeto, ou seja, com aquilo que ele quer conhecer, o sujeito acaba alterando aquilo que deseja conhecer.  De onde se concluiu que não se conhece o mundo em si

Não se conhece o mundo como ele é. Não se conhece o noúmeno na linguagem de Kant.
O ser humano só consegue entender as coisas dentro das categorias de tempo e espaço.  Importante ressaltar, aqui, que o tempo é uma invenção, uma criação do homem. Então quando o ser humano tenta entender o mundo, ele, o enquadra dentro da intuição tempo ou da intuição espaço. Então quando se intui essas coisas do universo, ou tudo aquilo que é em si, elas são alteradas. Se elas são alteradas porque a vida humana é fenomênica.

Existe as coisas em si, a realidade como ela mesma, e existe aquilo que o ser humano é capaz de compreender dessa realidade que é a coisa para si, os fenômenos. O ser humano vive no mundo dos fenômenos.  O ser humano vive no mundo das representações e não no mundo em si. Mesmo quando o homem pensa em si mesmo, ele está representando a si mesmo. O homem não conhece a sua realidade. O homem é um ser em si. O homem quando tenta se conhecer, ele só conhece aquilo que ele é capaz de conhecer de si mesmo.  Vivemos das representações. Só que toda representação humana tem uma origem. Toda representação tem algo que explica tudo. Algo que é inconsciente. A ideia de inconsciente surge com Schopenhauer, depois é retomada por Freud. É na inconsciência que a vida do homem é conduzida. Há algo que é inconsciente que rege as representações humanas e esse é algo é a vontade.

A Vontade

Qual é o papel da vontade na filosofia de Schopenhauer? Toda ação humana, todo pensamento humano, todo desejo humano está fora do controle humano, embora ele pense que está tudo sobre o seu controle, mas não é isso. Tudo o que se pensa, tudo que leva o homem a fazer se chama vontade. Schopenhauer declarou que “a vontade é um cego robusto que carrega um aleijado que enxerga.” A consciência humana é esse aleijado guiado pela vontade, esta que lhe é inconsciente. Vamos lembrar algo declarado por um homem que viveu no século primeiro da era crista, Paulo, o Apóstolo. Ele declarou que fazia conscientemente aquilo que não queria fazer, ao dizer: “O bem que quero fazer não faço, mas faço o mal que não quero.” Fica evidente que a vontade que decidia por ele, não era ele, quem decidia.  Schopenhauer compara o ser humano a um salmão que sobe o rio e mata a si mesmo para se reproduzir. O homem faz coisas que ao mesmo tempo são boas e ruins. Schopenhauer afirmou que a natureza é terrível para o individuo e ótima para a espécie humana.  Schopenhauer compara até mesmo o casamento ao salmão. Ele afirmou que o casamento é o martírio da reprodução.  O ser humano é guiado por uma vontade irracional e desprovida de fundamento. No entanto, é esta vontade que guia os passos humanos.  É essa vontade que faz o ser humano ser o que é. Schopenhauer também vai dizer que falar em vontade de viver é um pleonasmo. A vontade é a própria essência da vida. Em razão de ela ser a essência da vida o ser humano sempre estará buscando satisfazer essa vontade.

A Felicidade

Sendo o ser humano guiado pela vontade como fica nesse sentido a felicidade? Schopenhauer compara a satisfação da felicidade como a esmola que se dá para o mendigo. Há uma satisfação naquele momento, podendo esta satisfação sobreviver por mais um dia.  Mas a esmola não o tira daquela condição. Assim é a felicidade para o ser humano. A vontade é satisfeita, mas nunca será plenamente satisfeita. O sofrimento será sempre uma realidade para os homens. Sempre que se busca a satisfação dessa vontade, ela será sempre e continuadamente passageira e de vez em quando a infelicidade e a tristeza voltará.
Schopenhauer usa de uma metáfora de um lugar perfeito, onde tudo fosse conseguido com facilidade e sem esforço. Mesmo assim o homem se sentiria insatisfeito. O desejo humano gerado pela vontade sente a necessidade de estar constantemente sendo renovado. Isso quer dizer que o ambiente perfeito traria para o homem o tédio, insatisfação, desespero até mesmo ‘o desejo ao suicídio.’

Como  evitar o sofrimento na compreensão de Schopenhauer?

Se o sofrimento é uma verdade, se o sofrimento é uma realidade e a satisfação da vontade não é um maneira de aliviar ou até mesmo impedir o sofrimento, o que deve o homem fazer? Schopenhauer baseado na tradição budista encontra uma das melhores formas para a dor humana: O homem, segundo ele, só conseguirá ter uma vida menos infeliz, se aprender a sufocar os seus desejos. Por sinal isso será para Schopenhauer a verdadeira ideia de liberdade que é contrária à satisfação de todas as vontades. Pois a satisfação das vontades, segundo Schopenhauer, conduz o homem ao sofrimento. Liberdade é aprender a sufocar a sua própria vontade, sendo uma maneira de se tornar independente dessas coisas. Diz ele:

“È quase sempre preciso que grandes sofrimentos tenham quebrantado a vontade para que a negação do querer possa produzir.”

A declaração acima do Schopenhauer é muito difícil de concretização, em razão da vontade e desejo humanos serem quase narcísicos, mas não impossível.