A percepção um estágio
pré-refletido
O ponto de vista da filosofia
ocidental a partir de Sócrates , assim como na filosofia moderna, entendia-se que
a percepção era algo precário ao conhecimento ou algo que vinha a atrapalhar o
processo cognitivo, por ser afirmar que a percepção engana a nossa visão, a
nossa audição, ao percebermos as coisas principalmente aquelas que se encontram
distante de nós e ao ouvirmos. Só que essa forma de pensar passou por uma
correção, porque não é o intelecto, não é razão que nos faz termos a percepção
das coisas no mundo.
No século XX essa maneira de
entender o mundo e as coisas que nos cerca foi analisada de outra forma,
contrariando essa maneira de pensar, pelo Filósofo francês, Maurice
Merleau-Ponty (1908 – 1961). Ponty possui duas principais abordagens
filosóficas: A fenomenologia e o existencialismo. Para ele a fenomenologia é a
ciência que observa o mundo antes do conceito e da ideia. E o existencialismo é
saber que o homem está no mundo, não sendo o homem a continuação do próprio
mundo e sim pertencente a ele. Este
acusou aquilo que durante toda a história da filosofia que tudo estaria voltado
para o intelecto, mas sem que isso fosse devidamente justificado. A pergunta
que Ponty faz é a seguinte: Se estamos no mundo, sem nenhuma ideia
preconcebida, o que nos toca mais é a percepção que temos das coisas, a maneira
como elas chegam até nós, via os sentidos ou é o nosso pensamento já elaborado
a respeito das coisas? Ele chega a conclusão que a percepção é o nosso
primeiro contato com as coisas a exemplo da psicologia infantil, como na vida
adulta, a questão de ordem cultural, o ponto de vista das nossas relações com
as coisas e também com os outros.
Percebemos então que há certa relação sensível, com o mundo, com as
coisas que passa pela sensibilidade antes de se transformar num pensamento
elaborado.
A partir daí se conclui que a percepção é o
nosso contato imediato com o mundo, com as coisas. Mas por uma série de razões
que se estendem pelos longos anos da filosofia ocidental, ouve uma fuga desse
contato primário que tem sido refeito pelo ponto de vista intelectual, em razão
da nossa cultura ocidental que nos ensinou, de maneira quase que radical que
verdade é coisa do pensamento. A verdade vai ser algo que diz a respeito a
nossa mente, nosso intelecto e dificilmente estaria numa relação direta e
sensível com as coisas, mas numa relação dicotômica como em Platão no seu mundo
sensível e o mundo ideal, como também em René Descarte como o seu cogito ergo sum .
Todavia, parece não ser bem
assim! O nosso estar no mundo antes de sofrer uma elaboração intelectual ele é
primariamente alguma coisas que nós sentimos. Sentimos o mundo, o vivenciamos
diretamente através do nosso aparato psicobiológico, sendo algo muito mais
imediato e direto. Se quisermos retornar a origem do nosso conhecimento, a
origem do nosso modo de existir precisará retornar ao estágio da percepção,
chamado por Merleau-Ponty de pré-reflexão.
Ou seja, a nossa vida não é sempre toda ela refletida, como se tudo o que
nós fizéssemos e tudo o que nós fôssemos e tudo o que nos acontece atingisse o
nosso intelecto. Então essa vida pré-reflexiva, pré-intelectual que é a originária.
Se a preocupação da filosofia é a
volta as origens, Merleau-Ponty propõe que essa volta seja feita através da
recuperação da pré-reflexão. Isto é, que a percepção seja algo que nos revele o
mundo pela primeira vez, pois sendo assim, a percepção deverá gozar de certa
prioridade e até mesmo de certa superioridade sobre o conhecimento elaborado.
Aquilo que nos é dado mais diretamente parece nos trazer uma verdade mais
efetiva, muito mais autêntica, do que aquilo que construímos através do nosso
pensamento que dicotomiza a realidade. A
percepção não é uma construção, a percepção é o modo de sentir o mundo, por ser
ela originária, primária, primordial com as coisas, com as
outras pessoas e de cada um consigo mesmo.
Contra o subjetivismo
filosófico e contra o objetivismo científico
Merleau-Ponty ao escrever uma
fenomenologia da percepção, se ocupou, nessa obra, com situações que tem estado
presente no pensamento filosófico ocidental, tais como a relação alma e corpo,
consciência e mundo e homem e natureza. Merleau-Ponty como já visto acima, era
contrário as formas dicotômica. Exemplos: dicotomia entre alma e corpo, a dicotomia
entre consciência e mundo, ou mesmo que dizer entre o sujeito e o objeto. Essas
separações dominavam o pensamento científico quanto o filosófico.
A filosofia identificava a
realidade com as ideias posta pelo sujeito do conhecimento, caindo assim no subjetivismo. A ciência identificava a realidade como os
objetos construídos por ela, caindo no
objetivismo. Contra o subjetivismo
filosófico e o objetivismo científico Merleau-Ponty escreveu:
“Nós não somos uma consciência
cognitiva pura, nós somos uma consciência encarnada num corpo. O nosso corpo
não é um objeto como descrito pela ciência, mas um corpo humano, habitado e
animado pela consciência. Nós não somos pensamento puro porque somos um corpo,
mas nós na somos uma coisa porque somos uma consciência. Nós somos seres
temporais... A percepção, reafirmo, é uma forma de sentir o mundo. Como tal
deve ser valorizada e priorizada em nossa relação como o universo, com as
pessoas e também conosco para que possamos assim perceber todas as suas
nuances. Portanto, somos seres espaciais, estamos em vários lugares,
preenchendo os espaços. Ouvimos enquanto falamos e, por vezes, falamos enquanto
ouvimos. Quando tocamos também somos tocados. Quando vemos, por vezes, também
somos vistos. Nosso corpo é a nossa forma de se ser no mundo. Por isso, buscar
percebê-lo dentro deste processo que é viver é o essencial ao nosso
autoconhecimento e ao entendimento daquilo que nos rodeia também.”
O tempo existe porque
existimos
Através da filosofia de Ponty há
duas perguntas e repostas elaboradas através da sua percepção de mundo: A nossa capacidade de percebermos o mundo iria
até aonde? Sendo o mundo, tempo e se apresenta de várias formas, não estamos no
mesmo lugar, pois o enxergamos de várias maneiras! Mas como saber se estamos no
mesmo mundo? Quando interagimos com o mundo. O mundo somos nós, e nós somos o
mundo. Nós somos tempo. Somos consciência pretérita e do que há de vir. “O
tempo existe porque existimos”
Merleau Ponty apresentou duas
abordagens filosóficas: A fenomenologia
e o existencialismo. Os seus estudos
foram voltados para o homem, enquanto ente existente. Os seus primeiros
pensamentos e obras foram inspirados pelo pai da fenomenologia Edmund Husserl. Ponty acredita em duas principais e mais importantes
características que se relacionam ao existencialismo. A primeira característica
que o homem é um grande projeto a ser construído e isso se torna possível a
partir de sua experiência com o mundo. A
segunda característica é a inexistência da essência, portanto o homem é aquilo
que se idealiza. O homem é foco do
debate sobre o conhecer. Para Merleau Ponty a filosofia permite novo
aprendizado do olhar sobre o universo que o envolve. O homem está no mundo, o
que quer dizer que este não é a continuação do próprio mundo e sim pertencente
a ele.
Merleau Ponty criticava as ideias
racionalistas, principalmente, as ideias de Descartes que negava os sentidos
como forma de experiência sensível. Ao
contrário, Ponty, acreditava que a realidade é formada pela nossa consciência e
todo conhecimento limita-se ao mundo dos fenômenos. Segundo o filósofo somos
uma consciência que capta através do corpo as coisas em torno, por isso não há
como separar consciência e homem como fez Descartes.
Para Maurice Ponty o conceito de
corpo é primordial, ao dizer “O meu
corpo é o meu ponto de vista sobre o mundo”. A percepção irá ser a
introdução do corpo no mundo. A descrição da realidade só pode ser feita
conforme ela se apresenta, pois o conhecimento é construído pela percepção e
esta é particular, imperfeita e
incompleta. Como já foi dito tem
como foco a relação do homem com o mundo. Para ele a percepção é uma vivência.
Toda percepção é uma forma de estabelecer sentido. Uma relação do sujeito
com o mundo ou natureza.
Membro fantasma
Em seu estudo sobre a
fenomenologia há uma grande contribuição com a ciência cognitiva, uma vez que
para ele não existia somente experiência mental, mas também experiência
corporal, chegando a conclusão que mente e corpo na são entes separados. Ambos
são partes de um único sistema. O seu estudo levou a explorar uma investigação
sobre o membro fantasma situação
essa que o sujeito amputado sente o membro perdido. Ele afirma que o corpo na é
simplesmente uma máquina, pois se fosse o corpo não reconheceria essa parte
ausente. Para ele o corpo nunca é apenas um corpo. É sempre um corpo vivido.
Teria a filosofia de Maurice
Merleau Ponty um percurso suficiente ao saber? Não. O filósofo se recusa
instalar de modo absoluto o saber, contudo a reflexão sobre os seus pensamentos
nos traz grandes contribuições. “A ilusão nos engana justamente fazendo-nos passar por uma percepção
autêntica” Na compreensão Pontyana a
realidade é uma ilusão, assim como a certeza de um determinado fato ocorrido. A
razão de uma ação é desconhecida e avaliá-las é uma prática de ilusão.
O mundo é uma constante ilusão.