terça-feira, 4 de dezembro de 2012

O DRAMA DA CONSCIÊNCIA E A DITADURA DA APARÊNCIA


A matéria a que nos propomos escrever tenta fazer uma síntese teológica quanto psicanalítica, visando unicamente falar dos enganos que a consciência nos promove, ao deixar-nos em crise. Como seria isso? Bom, alguns conceitos que temos recebido durante a nossa existência vai se formatando em valores, e estes condicionados, faz com que todas as ações que contrariam as informações apreendidas venham contribuir em mal-estar ou o que sempre denominamos como crise de consciência. Com isso, deveremos atentar que muitos desses sofrimentos são gerados por razões culturais, familiares e religiosas de onde advêm as formulações conceituais de certo e errado. A partir daí, toda e qualquer “desvio comportamental” sofrerá acusação do supereu (isso para todos que temos neuroses) condenando de transgressão os valores adquiridos como comportamentos a serem seguidos pelo que foi convencionado como normas do "bem- viver".
Por trás dessas elaborações conceituais estão presentes as tradições, princípios normativos, que fazem de nós quase robotizados, impedindo-nos de perceber a vida com mais abrangência e clareza. Somos passivos de princípios “judaicos-cristãos” que foram ao longo dos tempos interpretados dentro das formulações da Lei, anulando quase que por completo a verdadeira hermenêutica da Graça de Deus, misturando as normas judaizantes com o que a Graça se propõe. Vítimas de esquizofrenias conceituais que se misturam e se dividem faz com que todos sejamos sofredores por termos sidos formados com uma consciência conturbada e alucinada, pelo medo da transgressão de conceitos , valores e imperativos castradores fundamentados num cabresto, onde a direção a ser seguida é dirigida pelo poder, sendo este qual for.
Quanto mais libertos dos dramas da consciência mais libertos seremos dos erros que a ela foram impostos. Na tentativa de caminharmos de maneira salutar abordaremos questões de ordem teológicas e psicanalítica sem nos preocuparmos com o aprofundamento do tema supracitado..

CONSIDERAÇÕES TEOLÓGICAS

No livro de Jó encontramos um questionamento muito interessante que servirá para monologizarmos: “Quem da imundícia poderá tirar coisa pura? Ninguém” (Jó 14.4). Importantíssimo a partir desta pergunta internalizarmos e procurarmos o conceito de puro e imundo e qual das duas palavras é o nosso adjetivo. Em Isaías 64.6 lemos: “ Mas todos somos como o imundo, e todas as nossas justiças como trapo de imundícia...” Voltemos a pergunta de Jó: “Quem da imundícia [de nós] poderá tirar coisa pura? Ninguém”. É bem verdade, não podemos negar que há realmente impulsos de generosidade, atos de lealdade e honestidade, todavia, essas ações se destacam sobre um fundo de iniquidade e imoralidade escondidas. Devemos, pelo que parece, perceber que há uma antítese, uma manifestação contraditória flagrante entre as lindas exortações morais que enchem o mundo há séculos e a realidade humana cujo interior, a subjetividade não engana. É a partir daí que surgem os nossos dramas de consciência. Tentamos ser o que não somos! Falhamos vindo daí a frustração e a crise de consciência por não atentarmos para o estatuto apreendido desde a nossa infância, que nos escravizou ditando valores inalcançáveis pela alma humana. Por termos medo do social, sentimos interditados de sermos nós mesmos, de nos mostrarmos tal como somos expandindo segundo a nossa natureza, livremente. Parece que devemos estar atentos, pois a consciência é insaciável, volúvel e arbitrária. Não representa a presença de Deus em nós mas a sua ausência, por estarmos entregues a nós mesmos e de temermos o que podem dizer do que pensamos, gostamos e gostaríamos de expressar objetivamente sem preocupação com as sanções sociais que por trás destas, estão um mundo de iniquidade e que ao mesmo tempo são julgadoras de condutas. Estranhíssimo paradoxo! Contudo é assim que funciona A DITADURA DA APARÊNCIA!
Ainda na abordagem teológica, devemos considerar que os dois primeiros mandamentos da Lei, amarás o Senhor teu Deus, de toda a tua força e de todo teu entendimento e ao teu próximo como a ti mesmo, são imperativos sem nenhuma força de produzir sentimento. Logo, o amor não se realiza através de uma ordem, de mandado. Ter drama de consciência por não conseguir amar é viver debaixo do jugo da Lei. Dos dez mandamentos, os quatro primeiros eram alusivos a Deus e os seis últimos ao próximo. Os mandamentos com respeito a Deus são verticais (homem e Deus). Os mandamentos com respeito ao próximo são horizontais (homem e homem). Vejam o formato da cruz de Jesus no decálogo: uma linha vertical e uma linha horizontal. Sem uma dessas duas linhas não há cruz. A cruz é um símbolo do relacionamento com Deus e com o próximo. Uma linha para cima e outra para os lados. A cruz resolve e cumpre a questão da Lei como Ele disse que faria. E, quando cremos nele, ele atribui o mérito do cumprimento da Lei a nós. Somos justificados e perdoados. Ele sempre soube da nossa incapacidade de a cumprirmos. Devemos pois evitar todo e qualquer sofrimento de consciência por sermos incapazes de cumprir as normas estabelecidas pela Lei. Fujam dos que não sabem o que falam, esses são pertubadores da paz e responsáveis pela inquietude na consciência de muitos que os ouve.

SIMPLES CONSIDERAÇÃO PSICANALÍTICA

O psiquiatra suíço Paul Tournier fala de uma paciente que ficou transtornada depois de um processo de cura psicanalítica. A educação cristã dela foi localizando o pecado em uma lista bem específica de ações, das quais bastava abster-se para ter a consciência tranquila. Por sua análise, um abismo sem fundo se abriu à sua frente, uma dimensão totalmente nova do mal, que penetra em tudo, mesmo em nossas melhores intenções. Disse ele que ela ficou muito confusa com isto. Dizia ela: “ a Graça é como uma caixa muito pequena para conter o drama de consciência, que agora eu vejo como infinita”. Tournier declara que precisou ajudá-la a alargar a sua visão da infinita graça, na proporção da dimensão do rigor da consciência que a psicanálise havia lhe revelado.
O DRAMA DA CONSCIÊNCIA gerada também pelas pregações moralistas de nossas igrejas são localizáveis e tratadas. Contudo, os dramas inconscientes por alguma coisa que não sabemos o por quê é algo muito doido que se torna necessário ao mesmo tempo, compreender que a Graça de Deus precede todas as escuridões onde a análise psicanalítica pode nos conduzir.