Na parábola que Jesus conta sobre o fariseu e o publicano que foram ao templo para orar, encontramos:
Dois homens subiram ao templo, para orar; um, fariseu, e o outro, publicano.
O fariseu, estando em pé, orava consigo desta maneira: Ó Deus, graças te dou porque não sou como os demais homens, roubadores, injustos e adúlteros; nem ainda como este publicano.
Jejuo duas vezes na semana, e dou os dízimos de tudo quanto possuo.
O publicano, porém, estando em pé, de longe, nem ainda queria levantar os olhos ao céu, mas batia no peito, dizendo: Ó Deus, sê propício a mim, pecador!
Digo-vos que este desceu justificado para sua casa, e não aquele (Lc. 18.10-14)
Na linha do não ser ele declara: não sou como os demais homens. Primeira qualidade que ele evoca é a do roubador. Por que será? O publicano que estava do outro lado orando era considerado pela sociedade, um elemento corrupto em virtude de ser cobrador de impostos e de cobrar além daquilo que era devido, ou seja, um ladrão. O fariseu usa a oração para atingir o seu semelhante. O fariseu vai dizer que os homens são injustos mas ele não. Adúlteros mas ele não, tudo isso “graças a Deus” conforme o v.11. Já na linha do fazer ele declina: Jejuo duas vezes na semana e dou o dízimo de tudo quanto possuo.
O filósofo alemão Ludwig Feuerbach afirma que Deus não criou o homem mas o homem criou Deus. Em parte o filósofo tem razão. Na realidade o Deus do fariseu não existe, é uma construção do seu imaginário. O imaginário ético e moral desse homem unido a Deus, faz com esse Deus não exista, no momento que o agradece por não ser como os demais (Lc18.11). O deus do fariseu ao preterir o publicano consequentemente preteri ao Deus a quem o publicano dirige a oração. Mas é a oração do publicano que Deus ouvirá concedendo a ele a justificação! (Lc. 18.14). Fica evidente que Deus não justifica ninguém por viver uma vida ética exemplar, mas somente aquele quem Ele substitui.
Os fariseus que acusaram a mulher pega em flagrante adultério, eram todos adúlteros, razão de não terem atirado pedras nela. A tradução interpretativa quem não tiver pecado atire a primeira pedra não é fiel ao texto grego, mas aquele que não tiver cometido o mesmo pecado dela... que seria uma interpretação e tradução fidelíssima do texto. Jesus tratou com um comportamento específico ao que lhe foi apresentado como objeto de acusação, por isso não poderia ser tratado como genérico a situação moral a ele apresentada registrada em (João 8.1-11).
O fariseu subiu ao templo clandestino e desceu pior, reprovado v.14. Subiu sujo desceu mais sujo ainda.
Muitas vezes é melhor nem ir ao templo orar ou até mesmo nem freqüentá-lo.
Entretanto, a oração do publicano ao bater no seu peito foi: Sê propício a mim pecador demonstrando que por traz do seu peito havia sentimentos que ele não conseguia se libertar. A oração do publicano é um pedido angustiante de substituição. O verbo ilasqhti (propício) imperativo passivo, que aparece no texto grego do Novo Testamento, cuja origem vem de ilasmoV seria o mesmo que dizer:
“Oh Deus me substitua, assuma a minha culpa tome o meu lugar, faça por mim aquilo que não consigo fazer”
O publicano ao internalizar a sua ética percebeu que sem a substituição o seu interior estaria comprometido. Ele não conseguiria jamais deixar de sentir e de desejar com as manifestações do seu coração. Ele precisava ser justificado. Diz –nos o texto que o publicano foi justificado. O publicano subiu ao templo para orar na condição de fraude clandestina, todavia desceu uma fraude autorizada. O fariseu que era da linha do não ser e do fazer não foi justificado. O fariseu foi reprovado! V.14. O fariseu não internalizou a sua ética, a sua moral. Ele não se percebeu como indigno assim como todo homem é, cujo coração é enganoso e perverso (Jer. 17,9). O fariseu iniciou a sua oração dando graças a Deus v.11. Mas que Deus era esse? Um deus construído a sua própria imagem e semelhança. Um deus feuerbachiano. Um deus que não justifica. O deus do fariseu era o deus do seu próprio imaginário. O deus construído conduz o religioso emitir juízo de valor sobre o seu próximo, ainda que esteja falando de si mesmo.