sábado, 13 de fevereiro de 2010

CRISE EXISTENCIAL (HAITI)




Sinto-me triste quando percebo que a injustiça social é vista como uma conspiração satânica, e não como fruto de uma construção social perversa (Ricardo Gondim).


O tema CRISE EXISTENCIAL mobilizou o nosso coração a escrever algo sobre o ocorrido no Haiti. As cenas televisivas foram vistas no momento em que estávamos almoçando. Naquela reportagem a comida parecia ter feito um bolo na garganta, ficou interditada. Surgiu-nos então, algumas perguntas após vermos aquelas cenas horríveis de vários corpos abandonados nas ruas e outros sendo colocados em caminhões, por uma pá mecânica. Não era gente era “lixo”. Daí, razão de alguns questionamentos : Como explicar teologicamente essa desgraça? Onde estava Deus no momento desse terremoto? Deus tem sentimento como nós brasileiros, tropicais, gente de terra quente? Ou Deus é frio, apático, não está nem aí? Caetano Veloso canta que o Haiti é também aqui. Teríamos nós uma teologia para explicarmos a dor no mundo? Ou a nossa teologia é essa vergonha importada de brincadeira de pique nas nuvens? Hê, Hê, o pique está você! Hê, Hê o pique está com você! Esse tem sido o assuntos domingueiro que em muitas igrejas tem ensinado: brincar de pique ou de cabra cega! (Vamos brincar enquanto não dói na gente) Hê, Hê o pique está com você. Hê você não me pega, não me pega, aqui na nuvem é muito legal brincar né irmão, né irmã? É uma inerguminidade eclesiástica, divorciada da realidade social tentando viver a libido "celestial."



Sendo assim, antes de tentarmos dar resposta teológica à dor vejamos a composição de Caetano Veloso e Gilberto Gil:




Quando você for convidado pra subir no adro
Da fundação casa de Jorge Amado
Pra ver do alto a fila de soldados, quase todos pretos
Dando porrada na nuca de malandros pretos
De ladrões mulatos e outros quase brancos
Tratados como pretos
Só pra mostrar aos outros quase pretos
(E são quase todos pretos)
E aos quase brancos pobres como pretos
Como é que pretos, pobres e mulatos
E quase brancos quase pretos de tão pobres são tratados
E não importa se os olhos do mundo inteiro
Possam estar por um momento voltados para o largo
Onde os escravos eram castigados
E hoje um batuque um batuque
Com a pureza de meninos uniformizados de escola secundária
Em dia de parada
E a grandeza épica de um povo em formação
Nos atrai, nos deslumbra e estimula
Não importa nada:
Nem o traço do sobrado
Nem a lente do fantástico,
Nem o disco de Paul Simon
Ninguém, ninguém é cidadão
Se você for a festa do pelô, e se você não for
Pense no Haiti, reze pelo Haiti
O Haiti é aqui
O Haiti não é aqui
E na TV se você vir um deputado em pânico mal dissimulado
Diante de qualquer, mas qualquer mesmo, qualquer, qualquer
Plano de educação que pareça fácil
Que pareça fácil e rápido
E vá representar uma ameaça de democratização
Do ensino do primeiro grau
E se esse mesmo deputado defender a adoção da pena capital
E o venerável cardeal disser que vê tanto espírito no feto
E nenhum no marginal
E se, ao furar o sinal, o velho sinal vermelho habitual
Notar um homem mijando na esquina da rua sobre um saco
Brilhante de lixo do Leblon
E quando ouvir o silêncio sorridente de São Paulo
Diante da chacina
111 presos indefesos, mas presos são quase todos pretos
Ou quase pretos, ou quase brancos quase pretos de tão pobres
E pobres são como podres e todos sabem como se tratam os pretos
E quando você for dar uma volta no Caribe
E quando for trepar sem camisinha
E apresentar sua participação inteligente no bloqueio a Cuba
Pense no Haiti, reze pelo Haiti
O Haiti é aqui
O Haiti não é aqui.




Jesus foi abandonado por Deus e pelos discípulos. Declara Jurgen Moltmann que Jesus cai por terra e a terra é a única que o sustenta e Lutero traduz as palavras do sofrimento de Jesus dizendo: Minha alma está triste até a morte. Entretanto, percebemos não somente que Deus abandonou o seu filho, como também ele se abandonou. Na cruz estava o Deus crucificado e morto. A morte de Deus evidencia um caos na criação, sendo assim, a morte de tudo o que vive, não deve ser visto como conseqüência do pecado, mas a destinação a que está sujeito tudo o que tem vida. Diz Jurgen que Jesus morre a morte de todo ser vivente em solidariedade com toda a natureza que geme. Por isso, diz Moltmann que os sofrimentos de Cristo são também os sofrimentos do tempo presente (Rm 8,18) que sobrevêm a todo ser vivente. Parece, então, que podemos afirmar que Deus está presente em solidariedade a todo sofrimento e dor existentes aqui na Terra. Ou seja, Ele sofre com os que sofrem, pois qual foi o sentimento de Deus ao ver o seu próprio filho na cruz sofrendo todas aquelas humilhações? DOR. Deus sentiu DOR! Deus é um Deus que sofre. Ele sofre porque é Deus.





UM DEUS QUE CHORA ANTES DE RESSUSCITAR!




Consideremos o choro de Jesus ( João 11.35). Na morte de Lázaro, Jesus chora e as irmãs de Lázaro também choram, porém, existe semelhanças e diferenças entre esses dois tipos de choro. A semelhança está que tanto o choro de Jesus quanto o choro de Marta e Maria evidencia a presença da dor. Todavia, a diferença se caracteriza pelo fato do choro das irmãs de Lázaro revelarem impotência de ambas em relação à morte do amado irmão. O choro de Jesus evidencia a dor e também a sua onipotência. Tanto é que após o choro Jesus ressuscita Lázaro. Logo, então, percebemos que a dor divina não anula a onipotência, nem a onipotência produz apatia e abandono. O Deus de Jesus Cristo é o todo poderoso e também é o Deus que chora e sente a dor do sofrimento humano. Deus está no Haiti solidário à angústia daquela nação!