sexta-feira, 20 de abril de 2018

Édipo somos nós!


Sófocles foi um dramaturgo grego, um dos mais importantes escritores de tragédia ao lado de Ésquilo e Eurípedes. Sófocles, então que vai escrever uma versão sobre o Complexo de Édipo e Freud vai trazer, através desse mito, dessa tragédia do Édipo Rei (oidipus rex),  uma contribuição valiosa à psicanálise.
Tentaremos elucidar o que é homólogo na tragédia de Édipo com o percurso de uma análise. Para isso precisaremos aqui dar uma abertura maior  a fim de que se entenda  que o acontecimento em Édipo é um efeito de acontecimentos anteriores.

Lábdacos foi pai de Laios  e Édipo, filho. Então vemos que Lábdacos foi avô de Édipo e o Laios o seu pai. Faz-se necessário voltar para algumas gerações. Vamos localizar aquele que é o pai de Édipo e o pai do pai de Édipo, visando assim perceber o que vem acontecendo nessa trajetória até chegarmos no Édipo Rei.
Lábdacos em grego significa o coxo e Laios em grego significa o torto e Édipo (oidipus) em grego é aquele que tem os pés inchados.  A partir do significado dos três nomes compreendemos que esses homens tem um andar dificultoso, claudicante, um andar trôpego, um andar labiríndico, um andar manco. Um andar que dá mancadas. Então poderemos já ir percebendo que o Édipo é aquilo que nos pega pelo pé.
Lábdacos morreu por reprimir o culto a Dionísio. Na mitologia grega, Dionísio era o deus do vinho, pois possuía os conhecimentos e segredos do plantio e colheita da uva. Possuía também os segredos da produção do vinho.

O culto a Dionísio ocorreu em várias regiões da Grécia Antiga, chegando até Creta. Eram grandes festas ou encenações teatrais. A alegria, os prazeres da vida e os efeitos do vinho eram temas recorrentes nas festividades dionisíacas relacionadas ao prazer.
Na mitologia romana Dionísio era conhecido como Baco. De onde se origina a palavra bacanal.

Laios ainda muito criança, com a morte de seu pai Lábdacos é criado pelo seu tio lipous, provavelmente era uma pessoa obesa, em razão do seu nome parecer ter  o significados na sua raiz de lipídios, gordura.
Lipous por pertencer a dinastia e em sua luta pelo poder acaba sendo morto.  Laios que ainda será o pai de Édipo é levado rapidamente para outra região que é a Frigia, hoje a Turquia. Lá neste novo reino Laios é criado pelo Rei da Frigia chamado Pelops. 

Mais tarde esse Rei tem um filho com uma ninfa e esse menino é chamado de Crisipos. Este menino quando chega na sua adolescência passa ter como o seu professor, Laios. Em determinado momento Laios se apaixona por Crísipo nada que se torne escandaloso àquela época. Há todo um contexto antropológico cultural, fazendo parte da realidade daquela sociedade a relação entre iguais. Todavia, Pelops que confiou o seu filho a Laios ao saber que o seu filho Crisipos foi raptado por Laios para fins libidinosos, lança uma maldição: “Se tiveres um filho ele te matará e toda a sua descendência desgraçada será.” Laios ao ser amaldiçoado se dirige para Tebas onde fixará residência. Em Tebas ele se torna Rei. Ao assumir o trono Laios realiza bodas com  Jocasta.

Ao consultar os oráculos Laios é avisado que ao estar em para Tebas deve se manter protegido em sua  autonomia e promissora nas decisões politicas, ele (Laios) não deveria ter nenhuma  descendência. Tanto Laios quanto a Jocasta tinham muito cuidado, evitando uma possível gravidez. Só que um dia Laios ficou bêbado com o vinho (aspecto Dionísico ) e através do efeito etílico, ele se descuida, engravidando Jocasta.

É aí que nasce Édipo. Laios temendo que a maldição sobre o filho que ao chegar a idade adulta o mataria, Laios enfia um ferro no pé da criança (Édipo) e dá ordem a um dos seus funcionários, um serviçal para matar a criança e larga-lo no monte abandonado a sua própria sorte. Esse serviçal fica sensibilizado encontra com outro serviçal de outra região que é Corinto e entrega a criança para esse serviçal que era um pastor.  Este pastor ao ver o menino com o pé atravessado por um ferro ele o nomeia esta criança por Oidipous (aquele que tem os pés inchados).  É a partir daí que a história de Édipo começará a fazer sentido através de um outro que o precede. 

A tragédia de édipo tem tudo a ver com o percurso dos acontecimentos que o antecederam.
Édipo  é levado para Corinto pelo pastor que ficou sensibilizado com o sofrimento da criança a entrega a um casal que cuida dele. Certa ocasião, Édipo já adulto, participando de um banquete ele escuta de um indivíduo que estava bêbado que ele, Édipo (Oidipous) era lastós, ou seja, ele era uma fraude, falso, sem  legitimidade. A partir daí ele fica incomodado com essa insinuação, então ele procura saber quem ele é. Quem sou eu? Pergunta édipo a ele mesmo. Provocado por esta indagação ele se dirige para o oráculo de Delfos. O oráculo ao responder, escandaliza até mesmos os lideres religiosos, presentes. Édipo escuta que ele mataria o seu pai e se uniria num intercurso sexual com a sua mãe.  Ele ao saber disso, se agita, se perturba em si mesmo, evitando retornar para a cidade de Corinto. Oidipous (Édipo) evita Corinto para fugir de seu destino. O interessante é que quanto mais ele foge do seu destino ele vai cada vez mais ao encontro do mesmo.

Em Corinto, ele se depara com um grupo de pessoas que vinham em suas carruagens, respectivas, e numa encruzilhada, há uma discussão que chegam as vias de fato. É nesse exato momento que Édipo mata Laios o seu pai. Após esse ato Édipo se refugia nas montanhas. Depois de algum tempo nas montanhas ele vai para Tebas. No caminho ele tem outro tipo de encontro.  Agora indo para Tebas ele tem outro encontro. Ele agora se encontra com a Fix ( esfinge). Fix é derivado de um verbo grego que significa asfixiar. Ninguém, jamais passaria  pela esfinge se não fosse capaz de decifrar o enigma proposto por ela, do contrário ela mataria asfixiados todos aqueles que não decifrassem o seu mistério enigmático.  Percebemos que o caminhar de uma análise tem a ver com o itinerário que conduz  um encontro com a esfinge.
O encontro de Édipo com a esfinge é o encontro com aquilo que asfixia, sufoca, tira a capacidade de respirar. Ninguém nunca havia conseguido responder ao enigma da esfinge, o que se conclui que todos foram asfixiados por ela.  A maneira da esfinge falar é obscura, abscôndita, de difícil acesso. Em razão disso que ela propõe o enigma para Oidipous:

O que é que tem dois pés sobre a terra, quatro pés e três pés e um nome só? Ou numa outra versão: O que é que de manhã anda de quatro pés, à tarde com dois pés e à noite com três pés? Oidipous consegue responder ao dizer que a resposta é o homem. Ele soluciona o caminho bloqueado, a esfinge sai do seu caminho e ela se lança no precipício. Mas Oidipous ao responder, o homem, ele está falando de si mesmo.
Quando a esfinge faz a pergunta ela fala sobre Tretrapous (quatro pés), depois Dipous (dois pés) e finaliza com Tripous ( três pés), a sonoridade dessas palavras tem a ver com Oidipous, porque a esfinge o inseria na pergunta. No processo analítico o interessante é conseguir se achar na pergunta. Quando Oidipous responde ser o homem a resposta dele está falando do próprio sujeito. 

Há uma pergunta feita por vários sujeitos a um Rabi sobre uma determinada mulher, flagrada, adulterando: “E tu o que dizes?” Observe que eles não se percebem na pergunta. A resposta do sábio Rabi fez com eles se vissem inseridos na pergunta, ao dizer: “Se vocês não tem o pecado dela atirem a primeira pedra.”
Retomando o caso Oidipous, ele é o sujeito que se depara com o discurso do seu inconsciente, fazendo ele perceber que a sua resposta tem a ver com ele mesmo, ao conseguir se ouvir tanto na pergunta quanto na resposta. O dizer sobre o sujeito está proposto em meio às perguntas, importando que o sujeito se escute em meio ao discurso.

Finalizando, concluímos em dizer que numa análise é importante observar a relação do sujeito no encontro com o outro ou outros, da mesma maneira daquele outro ou daqueles outros que precederam a Édipo. Na relação com o outro tem uma relação com a “esfinge”, isto é uma relação com o enigma a ser percebido pelo próprio sujeito.